5 de Janeiro de 2020.

A foto abaixo (tirada pela minha irmã) fez um ano hoje. Ela documenta uma experiência muito inusitada e quase surreal que eu vivi em Janeiro do ano passado, quando fui pra Inglaterra pela primeira vez desde 2016 pra apresentar uma pesquisa sobre como o fandom de BTS ocupava o Twitter, na Kingston University. Experiência sobre a qual eu, autointitulada “contadora de histórias por vocação divina”, nunca escrevi. Por falta de saco, por falta de tempo, por falta daquelas palavras que a gente só encontra depois que pensa o suficiente sobre um acontecimento. Mas hoje, 5 de Janeiro de 2021, parece que é finalmente um bom momento pra falar a respeito dela.

Eu sou Arquiteta apenas de formação, não de ocupação. Eu pago minhas contas com aulas de Inglês, a língua que eu domino o suficiente pra que a usasse para apresentar minha pesquisa independente diante de uma pequena plateia de gente que eu respeito muito de alguns países diferentes. A mesma língua cujo domínio me permitiu viver na Inglaterra por 11 meses entre 2015 e 2016, uma experiência que, em larga escala, definiu minha vida, mas, em pequena escala, tornou a viagem do ano passado mais especial, pelos sabores inconfundíveis do reencontro.

Comecei a dar aulas de Inglês em Abril de 2019, mas me comprometi de verdade com o trabalho apenas em Outubro, por conta da viagem, também, pois ela foi razoavelmente inesperada e eu precisava banca-la. Ainda bem que, em Fevereiro de 2007, meus pais conseguiram negociar um preço bacana pra que eu começasse a estudar na Cultura Inglesa de Uberlândia. Na época, eu tinha 12 anos incompletos, e, como a criança que eu era, achava que já estava “muito tarde” pra que eu finalmente realizasse o sonho de começar a aprender inglês (que inocência a minha). Nessa escola, eu conheci professores que me ensinaram a amar aprender a me expressar em uma língua diferente. Fiquei lá até o fim de 2012, quando completei meu curso CAE.

De volta a Outubro de 2019, admito que a falta de um diploma em Letras me fazia ter reservas quanto à começar a dar aulas; mas, naquele período especificamente, eu estava um pouco mais confiante que em anos anteriores, e a janela da oportunidade me parecia grande o bastante para que eu pulasse por ela. Estudando Coreano desde o começo do ano, eu havia constatado que minha mente muito analítica – afiada pela formação de Arquiteta, e combinada com minhas experiências estudando a Língua Inglesa e a Língua Alemã – tinha me ensinado a sistematizar as línguas de uma forma muito conveniente. Eu era capaz de me aprofundar nas suas estruturas, fundamentos e oportunidades de expressão usando minhas estratégias de análise de projeto, compreendendo e desconstruindo as duras e assustadoras regras, e fazendo com que meus alunos adultos finalmente entendessem como usar o “don’t” e o “doesn’t”, e como pronunciar “cycle” sem perder o sabor do L depois do C.

Essa pronúncia do L, por si só, me é muito cara – custou muitas horas de exercícios para que ensinasse minha língua presa a se mover da forma certa. Nessa mesma época, o distante ano de 2009, eu ainda estudava alemão, e alternava os esforços em L com os esforços em contornar meu freio para pronunciar os R’s em “Wir sterben niemals aus”, minha música favorita da banda que me motivou a estudar. Domar a minha língua para que se movesse de forma a reproduzir os sons que ela era naturalmente incapaz de fazer foi fundamental para que eu desenvolvesse a capacidade de reproduzir qualquer som que eu ouvisse. Essa habilidade inesperada me ajudou quando comecei a estudar canto, participou do desenvolvimento do meu sotaque que me faz soar como uma Americana que ficou tempo demais no Reino Unido, além, claro, de me ajudar no desenvolvimento da fluência e da desenvoltura com a qual eu conseguia falar uma língua que não era a minha – incluindo meu desafio mais novo, que é aprender Coreano o suficiente pra pensar numa pós-graduação na Coreia do Sul no futuro próximo.

Assim como eu estudei Alemão por causa de Tokio Hotel e Cinema Bizarre, a verdade é que comecei a estudar Coreano, sim, por causa dos meus artistas favoritos da Coreia do Sul. Eu conheci todos mais ou menos na mesma época, mas aqueles são parte da minha adolescência, enquanto estes são da minha fase adulta. Eu, adolescente, sonhava em ser designer, e estudar na Bauhaus; eu realizei o sonho de visitar o prédio da escola em 2016, durante meu intercâmbio, um dia antes do meu aniversário de 21 anos. Andando por aqueles corredores, eu tive a convicção de que os sonhos da Luisa de 14 anos, que haviam me carregado até aquele local, morriam ali mesmo. A Alemanha era, na verdade, o destino original que eu tinha em mente quando me inscrevi no programa de bolsas. Cá entre nós, eu fui para o Reino Unido a contragosto – eu sequer queria ir pra Leicester (a cidade onde conheci meus melhores amigos, que também reencontrei em Janeiro do ano passado).

Eu ainda não encontrei uma nova visão de futuro que me carregue como antes, mas eu tenho novos pequenos planos pelos quais consigo trabalhar e, com a Graça de Deus, alcançar, se for conveniente, como viajar para o Reino Unido para apresentar uma pesquisa que foi fruto de me permitir ser fã mesmo depois de crescida, de algo que eu havia rejeitado dez anos antes, quando era adolescente. Uma pesquisa que não teria nascido se eu não tivesse me formado no que me formei, se não conhecesse as coisas que conheço, se não dominasse as línguas que domino, se não tivesse passado por cada um dos minutos das horas dos dias das semanas dos meses dos anos que me levaram até o momento em que essa foto foi tirada, há 366 dias.

Em 31 de Dezembro de 2017, vivendo um inferno familiar, eu fui dormir com um cinto enrolado em uma das mãos, escondido embaixo do meu travesseiro, com a promessa de que eu acabaria com a minha vida se acordasse sentindo a mesma dor que eu sentia naquele momento. Entre eu, meus pensamentos e Deus, foi o dia mais difícil que eu já vivi. Eu gostaria de dizer que toda aquela dor já passou, mas meu coração ainda dói muito, e voz que me diz pra desistir ainda sopra no fundinho do meu ouvido. A vida é dolorida, de viver, de ver, de ouvir falar, mas a minha mente muito analítica – afiada pela formação de Arquiteta, e combinada com minhas experiências chorando de dor de tanto pensar em tudo que acontece nesse mundo – me ensinou a sistematizar a vida de uma forma que me ajuda a aguentar firme, um dia de cada vez.

Estou próxima de completar 26 anos. Eu vivi uma porção de outras coisas na minha vida além das que eu relatei aqui agora. Muitas perdas e derrotas, muitas frustrações, coisas faltando, dias estagnados, tantos momentos que eu já esqueci e que nem sei dizer se foram mais ou menos importantes pra criar quem eu sou hoje, e muitas, muitas pessoas que eu encontrei ao longo do caminho, que me ajudam a lembrar que eu não sou a personagem principal da história da humanidade, mas que eu ocupo sim um lugarzinho, um minúsculo papel que quero desempenhar com honra e gratidão ao Arquiteto do Universo, que me concedeu o fôlego que me faz estar aqui, hoje.

Não se engane, crer que existe um propósito em tudo vai muito além de racionalizar as voltas que a vida dá, pra olhar com Graça pros casos e acasos. Não é romantizar nem negar a dor, mas acreditar que, por trás das curvas e ângulos da geometria da existência, existe algo maior que minha própria vida (que é tão frágil, tão pequena, e pode acabar amanhã, ou agora mesmo). Acreditar que existe um Arquiteto infinitamente Bom, cuja mente analítica é impregnada de Amor, e que produz pensamentos muitos mais altos que os meus – não um Deus do caos, mas um Criador que cuida das suas criaturas, que as acolhe como filhas e filhos, e deixa que vivam com as consequências das suas escolhas, enquanto se movem por terra, céu e mar, e causam múltiplas, infinitas reações em cadeia, desde as primícias dos milhares de anos em que a gente é gente sobre a Terra. Sempre que bate o medo, eu me agarro a cada pequeno momento, cada pequeno encontro, cada sonho perdido, cada plano frustrado, com a certeza de que coisa alguma entre todas as dimensões e domínios do visível e do invisível, até a Eternidade, de onde tudo vem, e para onde tudo vai, é em vão.

2016 vs. 2020

#2. o som que a estrela faz (reprise).

       Este texto é o segundo de uma série.

     Minhas primeiras músicas favoritas foram “True Colors”, “Clocks” e “I don’t wanna miss a thing”. Cada uma chegou até mim de formas diferentes – por CD, por rádio, e por uma fita de VHS que meus primos mais velhos assistiam o dia todo na casa da nossa falecida avó. Dos 4 aos 7 anos, muita coisa muda pra uma criança, mas algo de constante era que, nessa época, eu não entendia nada de inglês ainda – nem o mínimo que me permitisse entender o que as letras dessas músicas diziam. Eu só entendia os sons, e era muito suficiente; eu era apaixonada pela forma como elas soavam, e meu peito queimava com elas.

     Lá pelos meus 11 anos, eu ainda não falava inglês, mas escutava músicas japonesas o dia todo. Aos 14, minha banda preferida era alemã. Nunca aprendi a falar japonês, mas nunca deixei de escutar essas mesmas músicas dos meus 11 anos, mesmo que até hoje eu nem sempre saiba recitar a letra de cor. Alemão, por sorte, eu aprendi, mas, antes disso, eu aprendi a repetir foneticamente os sons das canções, como fazia com as minhas preferidas em japonês, porque me importava saber cantar, saber participar delas, enquanto eu escutava. Eu era apaixonada pela forma como nós soávamos juntas, e meu peito ainda queima com elas.

     Hoje eu tenho 24, mas tinha 23 ainda quando comecei a montar minha primeira playlist de músicas coreanas. Pra quem me conhece há muito tempo, era só mais uma das minhas muitas fases, mas não é que cada fase, mesmo que vá passar, importa pra caramba, antes que passe? Acho que hoje já tenho bem mais que uma dezena, mas a questão não são os números. A questão é que elas me tocam todos os dias, da mesma forma que outras músicas cujas letras eu desconhecia me tocavam, através de suas melodias, suas batidas, e de como suas vozes soavam, fazendo meu peito queimar com elas. Elas se comunicam comigo.

     Pra uma pessoa que fala muito, qualquer coisa vira um diálogo, mesmo que sejamos só eu e uma canção conversando, dentro dos limites dos meus fones de ouvido. Às vezes, eu respondo com meu silêncio, às vezes com movimentos dançantes, ou produzindo pensamentos na velocidade da luz, ou criando uma playlist nova e implorando que todos os meus amigos escutem, pra saber se eles também conseguem escutar o que eu estou ouvindo. Como se, por trás de algumas faixas, existisse um outro som, que faz sacudir o fundo das minhas tripas, e puxa elas de dentro pra fora, até que trava no coração, e meu corpo inteiro se sacode. Quando o Sublime se revela pra mim, pelos ouvidos, ele escorre pelos olhos, pelos braços, pelos dedos, como se eu fosse Santa Teresa em êxtase, como se fosse a primeira vez todas as vezes.

     Já tem muito tempo que eu tento explicar qual é o som que a estrela faz, e talvez eu tenha demorado tanto a entender porque achava que esse som vinha de dentro, porque se parece muito com uma queimação incessante no peito [já escrevi sobre isso uma vez, em 2012]. E é a mesma queimação que eu senti na infância, quando descobri minhas primeiras canções preferidas, e todos os anos seguintes, enquanto eu cresci e deixei que muitas músicas me tocassem e me construíssem. A confusão era, principalmente, um problema de referência, porque eu achava que deveria olhar pra dentro pra encontrar uma estrela, quando, na verdade, eu tenho certeza que todas estão no céu, do lado de fora, bem distantes de mim. Como a queimação no meu peito, o som que a estrela faz, que vem de dentro, é apenas resposta de outro som, aquele que ecoa por todo o Universo, desde o dia em que o Criador bradou que houvesse Luz.

     O Sublime é, antes de tudo, um convite à humildade. O som que a estrela faz se parece muito com o som do meu coração apertado batendo por entre os meus dedos, sendo atraído para fora, tentando convencer todo o meu corpo a virar do avesso perante à constatação permanente de que eu sou muito, muito pequena mesmo, diante de toda a majestade que pode existir dentro dos acordes que formam uma melodia. É o som da imagem da Glória, da qual eu sou apenas um reflexo – tal qual a Lua, uma fiel testemunha.  Parece loucura pensar que qualquer canção pequena possa fazer ressoar em mim os sinos da Eternidade, mas isso faz parte da loucura de ser um fragmento de poeira gloriosa no Universo – como todas as coisas pequenas, elas fazem mais sentido quando você considera o todo. Existem os momentos em que a gente tenta se explicar, e existem aqueles em que a gente apenas senta, e contempla a manifestação da Glória. Selah.

     Photo by Greg Rakozy on Unsplash

    [fiz uma playlist com algumas das canções que me fazem ouvir o som que a estrela faz.]

O Lado Escuro da Lua

     Já notou quão paradoxal é o fato de que nossa era humanista coloca o homem no centro do universo, mas, depois desses últimos séculos, o que nos restou como sociedade secular foi um bando de gente deprimida e ansiosa? Ajuda a entender se a gente pensar em termos comparativos. A Bíblia diz em Gênesis 1 que os astros foram colocados no céu para sinais, e eu sempre penso que tudo que nós precisamos saber de nós mesmos já aconteceu de alguma forma com as estrelas e planetas.

     Pensa comigo: a Terra gira em torno do Sol, a Lua gira em torno da Terra. A Terra é muito menor que o Sol, a Lua é muito menor que a Terra. O que faz um corpo celeste girar em torno do outro é a atração gravitacional que eles exercem – e, segundo a lei da gravitação universal, a força de atração mútua é proporcional às suas massas. Ou seja, um corpo só consegue fazer com que outros girem ao seu redor se ele for grande o bastante para sustentá-los.

     Se você pensar nos planetas como pessoas, e tentar montar uma cena em que a Lua decide que é o centro do sistema solar, agora, talvez a gente veria uma Lua esgotada de tentar sustentar todos os planetas e estrelas entre o Sol e aquilo que a gente chamava de Plutão. Talvez a gente sequer visse mais uma Lua, mas vários fragmentos de um corpo celeste arrebentado por um peso que sequer tinha estrutura pra suportar. Ou, talvez, a gente veria exatamente o que continuamos vendo, ou supondo que vemos, quando olhamos pro céu – Sol, Lua, planetas, todos no mesmo lugar – , porque a vontade da Lua de ser o centro desse sistema não inverte a ordem das coisas, não substitui a força gravitacional que o Sol exerce e mantém a Terra no mesmíssimo lugar, dando uma volta em torno do próprio eixo por dia.

     O problema, então, seria todo da Lua, porque, enquanto o universo continuaria girando e se expandindo da mesma forma, independente do que ela ache ou deixe de achar, na cabeça dela, todas as referências estariam invertidas, e talvez, em algum ponto, ela até acreditasse que a Terra estava o tempo todo girando em torno dela. E talvez causar o movimento das marés reforçasse essa ilusão de que era tudo sobre ela, no final das contas, e era tudo questão de ponto de vista mesmo, pra que ela descobrisse o próprio valor como ponto focal do universo. E, talvez ela começasse a achar que tinha luz própria, de tanto desprezar o Sol, e se deixasse esquecer que era apenas um reflexo, algum tipo de imagem, e que tinha um lado permanentemente escuro.

     Aconteceu, no entanto, que, no girar dos astros, todos se alinharam, e a Terra entrou no caminho do Sol. Houve escuridão sobre a face da Lua. Foi Pink Floyd quem nos deixou essa de presente – não existe um lado escuro da Lua; ela é, de fato, inteira trevas. Será que, então, ela se daria conta de que não tinha luz própria, e se deixaria afogar nas trevas? Será que seria capaz de crer que, em algum momento, o Eclipse passaria? Talvez, muito tempo depois, ela se daria conta de que não era a sua força que fazia o sistema girar, mas talvez ela aprendesse a relevar todos os fatos se sobrevivesse ao primeiro Eclipse e conseguisse suportar o tempo de escuridão, em prol da sua ilusão. Talvez a Lua seja uma grande iludida, sobrevivendo à todas as suas fases e seus ciclos de 28 dias, recusando-se a reportar-se ao Sol como sendo a fonte de Luz.

     Salmos 89:37 chama a Lua de uma “fiel testemunha” no céu. Eu sei, eu sei, aquilo fala da Aliança de Deus com Davi, mas não é uma imagem fascinante? Já ouvi gente dizendo que nós somos muito parecidos com as árvores, mas acho que somos muito parecidos com os corpos celestes, flutuando sob um campo gravitacional muito maior que o seu, sendo iluminados por uma Estrela muito maior que si, e ficando fascinados demais com o reflexo pra lembrar que somos feitos de escuridão, e que precisamos do Sol todos os dias. Nossa força não muda a forma como os dias giram, mas depende da nossa honestidade com os fatos reconhecer qual é a verdadeira ordem que faz surgir as estações. Aliás, a Bíblia também diz isso em Gênesis 1, não?

     Acho que era Kant quem dizia que não existiu nenhuma Revolução Copernicana, porque Copérnico não foi lá e tirou a Terra e substituiu pelo Sol no centro do sistema – só revelou a Verdade das coisas. Mas talvez o ponto que Kant não quisesse admitir é que a Verdade é a coisa mais revolucionária de todas, e traga os mais significativos impactos profundos pra história de quem vê a realidade sob o ponto de vista de correto. Neste momento, por exemplo, está muito calor, e eu não consigo pensar mais no Sol como Deus, mas como uma metáfora do inferno – mas isso não é mais assunto pra agora.

     [featured image by user Shinzo_Shikimira on Reddit]

Uma impostora melhor que você.

 

     Eu assumi, há algum tempo, um compromisso sem precedentes com a verdade na minha vida. Apesar de ainda estar em desenvolvimento, e de eu realmente não entender plenamente quais os termos deste compromisso, eu tenho descoberto que comprometer-se com a verdade e a integridade, de corpo e alma, é ainda mais desconfortável que você consegue escrever, ou descrever. E causa muita confusão. Começando em mim, ou você, porque nós somos essencialmente inclinados pra autopreservação, e, neste jogo de sobrevivência, tudo que mente, finge, ou engana, faz melhor ao ego.

     Existem pessoas que focam mais nos resultados, em vez dos processos que levam até eles, e cada um consegue mais ou menos ajustar a própria consciência de acordo. Eu particularmente sempre fui muito preocupada com os processos, mas eu fui viciada demais na opinião dos outros, desde criança (ou talvez todos nós fomos, mas eu não tenho como falar por todos). Quanto mais você se ocupa da opinião dos outros, mais facilmente você abre mão da verdade e da integridade – porque, na maioria das vezes, seus atos mais verdadeiros ficam só entre você e sua consciência, e isso raramente contribui pro sucesso da sua imagem perante os outros. Aliás, eu até ousaria dizer que a integridade mais importante é aquela que fica no secreto,

     Eu sei que tenho problemas com autoimagem e aceitação há uns bons anos – a maioria de nós tem, eu presumo – , mas, até algumas semanas atrás, eu te diria que tinha aprendido a me importar muito menos com a opinião dos outros. Eu reduzi drasticamente minhas expectativas e ambições na vida, passei a valorizar o silêncio, as coisas modestas e escondidas, os pequenos trabalhos e tudo aquilo que se passa pela minha mente e que nunca vai virar um texto, nem uma legenda de Instagram, nem uma frase no Twitter. Se você me perguntasse mais, eu diria que havia abrido mão dos desejos por alcançar lugares altos, e só queria ser “eu” – tudo dito em um tom que transformava qualquer outra pessoa que fosse ou pensasse diferente de mim em um ser “menos evoluído”.

     O problema é que minha mente não parava de refletir sobre todas essas coisas nas quais eu pensava. O fluxo de pensamento ficou flertando com o fundo da minha mente por vários dias, semanas, até que a ideia começou a se infiltrar e, então, eu precisei começar a assumir pra mim mesma que eu não era muito modesta, mas muito, muito orgulhosa. Profunda e extremamente orgulhosa. Tão orgulhosa (e ferida), que eu estava escolhendo abrir mão de todos os meus sonhos, planos, desejos, vontades, perspectivas, expectativas… Por medo de fracassar, sentir todas as dores da frustração, e me tornar uma piada diante dos olhos públicos. A covardice mais amarga que eu já tive que admitir.

     Eu era viciada na opinião dos outros, então toda ideia de valor que eu tinha de mim mesma estava baseada em ser a melhor em alguma coisa. Esses são os fatos, eu quase sempre estive em ambientes em que eu era a melhor em alguma das coisas que eu fazia – meus desenhos, meus textos, meu conhecimento sobre meus assuntos preferidos. Eu não tinha capacidade de me reconhecer como uma pessoa de valor se eu não fosse sempre a melhor, porque eu não conseguia imaginar como eu poderia ser amada de outra forma. E eu ainda tive muita disposição pra me esforçar pra superar pessoas do meu convívio que eram melhores que eu, e talvez por isso as pessoas que me conheciam sabiam me machucar tão bem, quando me diminuíam ou me comparavam de forma negativa. Sempre foi tudo que eu tive.

     Crescer invariavelmente me trouxe cada vez mais provas de que eu poderia sempre ser muito boa, com meus talentos naturais, e meus esforços, mas que, em algum lugar do mundo, sempre haveria alguém melhor do que eu. Poderia ser na China, mas também poderia ser do meu lado. Na minha sala, na minha turma, na mesma igreja, com os mesmos amigos. Eu era muito boa em artes gráficas, mas minha irmã se tornou muito melhor que eu. Minha melhor amiga estudou um curso de Humanas e leu muitos mais livros que eu. Foi com certeza também o que consolidou meu pânico de autoestima, quanto mais eu percebia que eu jamais seria a mais bonita, ou mais magra, nem comparada com as meninas ao meu redor, nem comparada com as milhares de meninas que a gente consegue ver todos os dias, agora, pela internet, como uma galeria de terror, de todos os rostos e corpos que eu nunca terei.

     Com o tempo, conforme eu conheci muita gente que argumentava melhor, e escrevia melhor, que havia amadurecido muito mais, e aguentava muito mais, e era muito melhor que eu em todas as coisas nas quais eu me apoiava pra sobreviver, eu entrei em desespero – e, no meio do desespero, tomei todas as decisões erradas. Eu estava me agarrando a ídolos de papel, que se desmanchavam nas águas do mar no qual eu estava, mas, em vez de trocar de barco, eu preferi me afogar, porque eu não estava disposta a passar pela dor excruciante de tirar uma parte de mim. Como se isso fosse um câncer muito grande, como daquelas pessoas que acabam deformadas pelo tamanho e peso dos tumores, que precisava ser tirado sem anestesia, porque é assim que as coisas da alma funcionam.

     Minha irmã passou os últimos quarenta dias fora, e voltou com uma frase que me perfurou dolorosamente – a verdadeira humildade é querer ser exatamente quem você é em Deus, nada acima, nem abaixo, mas querer ser tanto mais quanto menos do que quem você é, é orgulho. Eu poderia jurar pra mim que estava agradando a Deus e deixando ir embora meu orgulho, escolhendo propósitos modestos e sonhos ínfimos, mas acabei descobrindo que, como uma boa ilusão, eu estava subindo uma escada, enquanto acreditava estar descendo. Passei meses tentando me comprometer com a verdade, enquanto vivia uma mentira, cheia de palavras bonitas, enfeitadas, repetidas, automáticas, que ajudavam a enganar minha consciência consciente. A minha grande sorte – e sua, caso você também tenha se identificado com isso – é que nosso subconsciente, e o Espírito, nunca se enganam. Mas, se estamos disposto a nos deixar convencer da nossa grande fantasia, fica a critério de cada um. Existem pessoas que focam mais nos resultados, em vez dos processos que levam até eles. Cada um pode tentar ajustar a própria consciência de acordo.

 

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     Esse texto não tem uma conclusão clara porque o processo ainda não está completo. Claro, existem muitas coisas ainda a se dizer sobre propósito, sobre identidade, sobre motivações secretas, desejos ocultos, perspectivas mais próximas ou mais distantes, qual o plano maior, e a razão pela qual nós existimos, mas tudo tem uma hora designada, e eu não sei se é esta. Eu poderia dizer, de forma bastante dramática, que estou no meu ponto mais baixo, mas eu não quero testar o quão ruim as coisas ainda podem ficar.

     No entanto, ainda tenho esperança suficiente pra esperar que esse seja realmente, pelo menos, o ponto mais baixo deste processo, e que o que vem em seguida é cura e plenitude, mas eu achava que estava assim há bem pouco tempo, e consegui descobrir que essa estrada tinha mais uma curva acentuada inesperada. Dói demais, eu não consigo aceitar às vezes o quanto dói ser humana e insistir em ter fé suficiente pra acreditar no fim dos processos, quando tudo que você queria era uma morte rápida, e indolor. Literal ou figuradamente, cada um interprete como quiser. Mas, convenhamos – o tempo se arrasta, ou voa, mas, de qualquer forma, a morte chega, qualquer morte que seja. Não é melhor continuar acreditando que, se eu aguentar essa dor, posso alcançar Graça pra Vida plena depois? Eu realmente penso que sim.

Photo by Steinar Engeland on Unsplash

Um comentário honesto sobre Nós – o que eu acho que sei sobre Amor, Verdade, e os clichês do Ser.

     (Não que os outros não tenham sido honestos, claro)
     Gastei algum tempo hoje refletindo sobre tudo que eu tenho escrito e pensado nos últimos meses. Esse blog sempre foi principalmente um canal pra extrapolar os meus pensamentos sobre várias coisas, mas uma análise atenciosa demonstra como eu tenho uma tendência inegável a refletir sobre o Ser e suas muitas implicações.
     E isso não é um sintoma de excesso de discurso e falta de prática. Pelo contrário; sem transformar isso em uma autodefesa, mas eu sempre busquei ser atenta às implicações práticas das coisas nas quais eu pensava. Aliás, foi assim que esse comentário honesto aqui nasceu; uma reflexão sobre o que eu aprendi, depois de tantas crises existenciais, emocionais, espirituais, histéricas e afins. Ou o que eu estou aprendendo, porque o processo parece longe de acabar.
     Ainda quero desenvolver isso melhor em outro momento, mas por ora basta eu te contar que tem uns 5 ou 6 anos que eu tenho pensado muito sobre como o mundo precisa de mais empatia. “Mais Amor, por favor” não adianta nada se tivermos mais amor interesseiro, egoísta, buscando os próprios ganhos e benefícios – amor este do qual o mundo JÁ está transbordando. O genuíno Amor transformador, desde os contos de fada até as mais antigas religiões da humanidade, é o Amor desinteressado e altruísta. E não existe Amor que se sacrifica sem empatia, sem a capacidade de se enxergar na dor do outro (e, sim, isso é bíblico – Hebreus 4:14-16, a empatia é o fundamento do milagre da Graça).
     Indivíduos só são capazes de se compadecer daqueles que eles enxergam como sendo seus semelhantes. Por isso alguns seres parecem ser mais “humanos” que outros, para certas pessoas – diferenças de classe, etnia, língua, e até espécie (pra certos vegetarianos/veganos radicais) alteram o grau de humanização que atribuímos uns aos outros. E se eu me vejo como diferente de todo mundo, ou melhor que todo mundo, vou desejar pra mim apenas coisas que não desejo pros outros, e se eu realmente acredito que todos somos iguais, vou buscar justiça pra que todos possam compartilhar dos mesmos direitos, e assim por diante. O princípio é simples. Mas tá, o que tem a ver?
     Quem me conhece há vários anos provavelmente se lembra muito bem de uma certa arrogância e um nível de egoísmo que permeavam tudo que eu fazia (sem tempo pra explicar com detalhes, mas eu me sentia tão isolada na vida que eu acreditava que ninguém era como eu e etc.). Pela misericórdia de Deus, tô me aproximando dos 23 com a plena conviccção de que a maior parte disso foi destruído na minha vida. Pela misericórdia de Deus, eu reitero, porque foi Ele quem permitiu que os caminhos que eu mesma escolhi pra mim fossem organizados pra me levar até o fundo do poço.
     O lado legal disso tudo é que Ele foi comigo e, chegando lá, pelas minhas próprias pernas, Ele foi a luz que me permitiu ver que, ao contrário do que eu pensava, eu nunca estive sozinha, nem no fundo daquele poço – muita gente tava lá. Muita gente que eu amava, conhecia, admirava, gente até cuja aparente perfeição machucava a minha percepção de mim mesma. Aliás, vamos tratar essa ilustração como se eu estivesse caída no Inferno de Dante, em vez do fundo do poço, e a luz divina me permitiu descobrir que eu não estava sozinha no meu círculo, mas que havia muitos outros, acima de mim, abaixo de mim, mas, mais importante, todos lotados.
     Nada é novidade. Todo mundo é um caos. Já leu isso antes, aqui? Vai ler muitas vezes ainda. É a verdade nua e crua (ou não a verdade inteira, mas pelo menos uma boa parte dela).
     Cada ser humano é um universo desgovernado em si, todo antagônico, e a maior revelação da minha vida foi descobrir que eu não era a única em guerra, a única dormindo aos prantos todos os dias, incapaz de formular pensamentos equilibrados ou passar um dia inteiro sem me odiar completamente. Eu descobri que todo mundo tinha níveis de carência, e todo mundo queria conseguir coisas por mérito próprio, fazia muitas coisas pra aparecer, postava fotos pra ver se uma pessoa X ou Y curtia, dormia no meio do tempo de oração, gastava horas preciosas refletindo sobre coisas desnecessárias.
     Descobri, entre lágrimas e risos, que nós todos somos humanos. Meu Deus! Que revelação aguada. Qual a grande surpresa?
     Meu problema com os clichês é que, quanto mais eu reflito sobre a vida, mais eu percebo que eles são reais, e que nossas vãs tentativas de quebrá-los nos fazem esquecer das verdades mais fundamentais da vida. Qual é a graça real em quebrar todos os paradigmas, mesmo? Tem coisa que, de tão desconstruída, deixa de ser verdade e vira mentira, só pela abstração. Parece capenga falar tanta coisa aqui como eu falei, pra no fim só constatar que nós somos todos humanos, mas será que nós já de fato vivemos como se entendêssemos que somos humanos? Fiz um exame cuidadoso de mim mesma aqui e, não, eu não. Não sei quanto a você.
     Não se engane. Muita gente ao seu redor tem tanta vontade de crescer e provar que pode fazer melhor que os próprios pais quanto medo de crescer e descobrir que é igual ou pior que eles. Quase todo mundo perderia o sono por ansiedade, ou esperaria coisas e se frustraria. São nossas tendências naturais. Se existe algum prumo que possa alinhar essas bagunças e nos ensinar a enxergar as coisas simultaneamente do nível do solo e dos olhos do pássaro, isso é outra história. Aliás, é o tal do processo do qual eu falei um pouco na “Carta aberta aos meus amigos”. Uma versão macro da mágica que transforma o caos dos pensamentos em poesia.
     Enfim. Amor. Empatia. Somos todos iguais, ou pelo menos muito parecidos. Não se cobre tanto, mas não se acomode. Não use as diferenças pra justificar as divisões. Não use as semelhanças pra justificar a uniformidade. E, se tudo isso aqui se parece demais com tudo que você já leu ultimamente, eu espero que hoje você acredite e aceite. E, se não for hoje, que outra pessoa, mais competente que eu, te convença a aceitar sua essência. Algum dia vai. Algum dia, vai.
    Photo by Andrew Moca on Unsplash

Carta aberta aos amigos – Eu acredito em você.

     O ser humano é uma máquina de contradições ambulante. Minha falta de conhecimento científico sobre o assunto me impede de saber se existe alguma teoria do comportamento que explique isso, mas, enfim, contradições. Nós somos naturalmente inclinados ao desacordo. Isso porque somos feitos de razão, emoções, e sensações; mente, coração e corpo. E não precisa ser muito reflexivo pra entender que nossa mente, nosso coração e nosso corpo querem coisas totalmente diferentes, o tempo todo. O desacordo entre as nações, entre os povos, entre as pessoas, começa no desacordo de dentro. Não há coerência, apenas o caos. E a tendência ao caos.
     
     Por isso, criamos tantos códigos pra nos comunicar e regulamentar, buscamos tanto pela Verdade, procuramos um prumo que nos alinhe, ou pelo menos crie condições de estarmos alinhados um ao lado do outro, ainda que o caos de dentro permaneça o mesmo. Existe alguma virtude no fingimento em sociedade, porque ele disfarça nossa total incapacidade de viver em paz (eu já até escrevi um pequeno parágrafo sobre como a falta de empatia evidencia a falácia da vida em sociedade). Cada indivíduo é um caos só.
     
     É por isso que as pessoas se machucam o tempo todo. Mente, coração e corpo em jogo, entre pais e filhos, irmãos, amigos, parceiros, casados, solteiros, colegas de trabalho, colegas de classe, conhecidos e desconhecidos passando pela rua; a imprevisibilidade de cada linha do tempo se encontrando com outras no lugar e na hora errados. Meias-verdades contraditórias tentando encontrar algum ponto em comum. O caos que há em mim saúda o caos que há em você – e algo explode no meio do caminho. 
     
     Um dos maiores triunfos da individualização das referências na sociedade pós-moderna foi transformar a geração da comunicação numa geração falha em comunicação. A multiplicação dos contatos evidencia cada vez mais o caos dentro de você. Numa palavra, numa mensagem, um olhar, um gesto, uma imagem, algo dito ou não dito, as pessoas conseguem construir ou destruir pontes, abrir ou fechar pra sempre portas, porque são tempos intensos, e ninguém tem tempo pra se demorar uns com os outros. Sua mente machuca o que seu coração ama, seu corpo rejeita o que sua mente aprecia, seu coração rejeita o que seu corpo quer. E, no fim, alguém sempre sai prejudicado – um, ou todos. É o preço.
     
     É muito confortável a posição de quem analisa as pessoas de fora, mas não repara nas próprias mãos sujas de sangue, ou nos buracos de bala furados no peito. Entre mortos e feridos, não se salvaram todos, e tanto eu quanto você fomos culpados de uma guerra que não acaba quando eu e você morrermos – a guerra do ser contra o próprio ser, seu ser interior, e todos os seres tentando ser, um dia de cada vez ao nosso redor. Eu simpatizo com a sua dor, amigo, porque ela sempre dói, ou já doeu, ou doerá em mim. E eu simpatizo com a sua culpa, porque a culpa sempre é, ou foi, ou será minha. Já disse o poeta que “o mundo gira, e vacilão roda”.
     
     A Bíblia me diz que eu não posso amar meu próximo verdadeiramente enquanto não amar a mim mesma. Eu te pergunto, quem poderia amar o caos que nós somos? Sem romantizações, eu acho bem improvável, porque o caos sempre machuca, e é machucado. Só me resta torcer por tudo aquilo que eu posso ser, quando reconciliar cada parte de mim e da minha história, pra que possamos viver em paz – ainda que seja um trabalho de uma vida toda. E ainda que a convergência completa seja apenas a expectativa do fim dos tempos, a esperança da plenitude ainda é suficiente. E, se eu posso me amar pelo meu potencial, amigo, eu também posso te amar pelo seu. Não desista nunca de quem você é, por todos os sacrifícios de quem você já foi, e por tudo que você pode ser. Você ainda vai muito longe. Eu tenho certeza. 
     

Futuro Marido, precisamos conversar.

     Hoje é Dia dos Namorados, ou “dos eternos namorados”, como dizem os casais mais velhos por aí. Eu não faço ideia de quem você seja, mas, daqui a alguns anos, seremos nós, trocando declarações bregas, ano após ano, até que o Senhor nos chame pra casa. Isso te empolga? Ainda digo pra todo mundo que prefiro que você nunca chegue, mas deve ser só um pouco de medo de que alguma coisa dê errado, e eu me frustre de novo. Eu já me frustrei bastante.

     Mas a verdade é que eu e meu melhor Amigo conversamos sobre você (mas não espalha por aí). Ele não me conta muita coisa ainda, mas escuta com atenção, e cuida de suavizar toda ansiedade no meu coração. Aliás, Ele cuida tão bem de mim, que prometeu que me confiaria a alguém que cuidasse como Ele. A pessoa mais parecida com Ele que eu conhecesse, foi como Ele me convenceu, foi o nosso combinado.

     Eu já me desgastei muito, sabe? Mas aprendi com Ele que não entregamos nosso coração em pedacinhos. O Senhor tem me ensinado a ser boa pra você, desde já. Nós reconstruímos muita coisa pensando em você e no futuro que vamos construir. Aliás, um baita de um futuro. Mal posso esperar pra que trilhemos juntos o caminho estreito, pra que arrebentemos as portas do Inferno e alegremos o céu com frutos. E filhos. Eu queria 4, educados em obediência e Graça, pra que O amem de todo o coração.

     Te escrevi a primeira carta aos 12 (mas já queimei, em algum lugar). Te pedi lendo comigo todos os livros do mundo, e morando em todos os países da Terra. Semana passada, pedi que chovesse no dia do nosso casamento, pra gente poder dançar sem que ninguém atrapalhe. Eu sei que seremos tão parceiros que ninguém saiba dizer se casados ou do crime. Arranjar umas confusões santas, sabe? Feito Priscila e Áquila. Virar noites conversando (porque eu converso muito). Visitar umas galerias de arte. Arrumar juntos a cozinha do almoço (eu lavo, você seca). Trabalhar pra ter uma casa, e depois abrir ela pra quem precise, feito Keith e Melody. Viver intensamente.

     Não sou tão inocente que deixe a esperança me cegar pra vida real, mas eu prometo que, pelo braço forte do Senhor, espantarei suas tristezas, e enfrentarei as suas batalhas, do corpo, do coração e do espírito. E a sua taça nunca ficará vazia, porque vem da mesa dEle o nosso vinho. Cearemos eternamente junto ao nosso Pai, e os céus serão testemunhas de que foi tudo pra Glória de Deus. Dessa forma, eu te espero, e vou guardando pra você meus abraços. Ninguém aqui tá com pressa.     

Nada escapa aos Teus olhos.

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     Existe um mistério por trás dos olhos do Pai.

     Pra ser sincera, existe um mistério por trás de todos os olhos que estão por aí, já que fomos feitos à imagem e semelhança dEle. Como são incríveis as muitas visões que podemos ter uns sobre os outros, e como eu gostaria de me enxergar pelos olhos de outros, e como eu gostaria de emprestar meus olhos para que outros vissem valor naquilo que é precioso para mim.
     Mas os olhos do Senhor passam por toda a Terra. Somos 7 bilhões hoje, mas nosso Deus Forte conhece cada pessoa que já andou por este planeta. Cada pessoa que já morreu já esteve sob o olhar do Pai uma, duas, tantas vezes. Ele vê tudo, aleluia. Ele conhece tudo, glorifiquem Seu nome. Não há onde possamos nos esconder, que Seu Amor não nos encontre – pois o Senhor não é um que nos vigia como um cão de guarda, porém um que cuida de nós.
     Deitada aqui na minha cama, muito depois da minha hora de dormir, enquanto penso sobre quem sou, ainda acho incrível que o Senhor tenha me visto, e me escolhido. Não posso culpar aqueles que acham difícil acreditar que Deus os ama e tem um plano para eles – apesar da nossa geração acreditar que o mundo gira em torno de nossos umbigos, os números de depressão e baixa auto-estima crescem. O mundo é tóxico à nós – às nossas identidades, à cada uma das nossas características e peculiaridades. Tudo nos é roubado, tudo é uniformizado. Eu já estive assim – não sabia quem eu era, pra onde ir, sem propósito. Só medo, e dúvida.
     Mas, nessa multidão de 7 bilhões, nada escapa aos olhos dEle.
     Pra ser sincera, eu não acho que seja grande coisa. Nenhum de nós é, não podemos fazer nada sozinhos. Somos limitados, mas Ele faz por nós tudo aqui que não poderíamos fazer. Quando caímos, quando nos perdemos, quando nos calamos, quando toda esperança se esvai, Ele está lá, esperando que clamemos Seu nome. Ele é a luz que queima mais que o Sol, e eu sou só uma coisinha de nada, me gloriando no Senhor. Eu celebro minha vida, os anos que se passaram, os que virão, o que estou vivendo. Celebro cada dia difícil, celebro as dores de ir e vir, porque o Senhor vai adiante de mim cada vez que dou um novo passo.
     Eu acredito que o mistério da piedade se basta em como o Deus Glorificado nos mantém seguros em Seus braços, e, apesar da nossa pequenice, tem um propósito para nós. E Ele só nos diz a verdade, e Sua verdade nos liberta – quando o mundo nos diz que somos fracos, e pequenos, e nos sufoca com suas perfeições inalcançáveis, o Senhor é misericordioso, e Suas misericórdias se renovam a cada manhã, e nós nos alegramos nas nossas fraquezas, pois é nelas que o Poder dEle se aperfeiçoa a nos faz forte.
     Os anos podem passar, mas meu coração permanecerá maravilhado por esse Amor que me salvou, e que me salva todos os dias, do qual eu nunca serei merecedora. Eu nasci para a glória do Senhor! Meu Pai cuida de mim. E que o mundo inteiro saiba que eu sou amada, todos os bullies, todos os senhores, todos saibam que o Senhor é meu escudo, o meu melhor Amigo, que levanta minha cabeça e me toma pela mão direita quando o mundo cai ao meu redor. Havia, sim, um mistério por trás dos olhos do Pai, e eu olhei através deles, e eu descobri – eu sou dEle, e Ele é meu.