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Dedicado à minha melhor amiga swift de longa-data e xará, Luíza.
alerta de gatilho // menções de distúrbios alimentares
Eu sou uma professora de Inglês com um diploma de Arquitetura e Urbanismo, mas, nas horas vagas, eu estudo fandoms. Eu me identifico como fã de coisas desde muito jovem; por isso, eu levo a alcunha de “fã” muito a sério. Então, no sentido mais estrito da palavra, eu não sou uma fã da Taylor Swift. Eu sou, no entanto, uma jovem senhora de 26 anos que cresceu com as músicas dela no plano de fundo dos meus anos de adolescência. Aos 14 anos, eu assistia o clipe de “You Belong With Me” quase todos os dias no TVZ, o suficiente para saber a letra de cor, e recorrer à essa música quando o menino de quem eu gostava no primeiro ano do Ensino Médio começou a namorar minha amiga mais bonita.
Eu achava interessante como, no clipe, Taylor lutava pelo rapaz que amava contra uma versão morena dela mesma. Quando eu tinha cerca de 6 anos de idade, estava no ar a novela “O Cravo e a Rosa”, inspirada na história de “A Megera Domada”, de Shakespeare. Meu cabelinho chanel, minha língua grande e minha irmãzinha caçula de cabelo loiro cacheado me renderam o apelido de Catarina por muitos anos, que eu passei a detestar depois que li a peça no Ensino Fundamental. Eu sonhava em renascer como uma Bianca, doce e amável — alguém como a Taylor, a garota mais bonita que eu já havia visto na altura dos meus 14 anos. Na minha cabeça, ela era alguém com quem eu nunca poderia me comparar; mas, nos quatro minutinhos daquela música, enquanto ela cantava sobre ser uma perdedora, mas ser aquela que realmente entendia o rapaz, eu conseguia acreditar que nós podíamos ser tão parecidas, quase as mesmas.

Infelizmente para mim, eu cantei essa música para dois rapazes consecutivos no Ensino Médio; assim como o primeiro nunca acordou e percebeu que “o que ele estava procurando havia estado ali o tempo todo” (eu), o segundo também não. Naquela época, parecia o fim do mundo, mas era bem o princípio das dores. O último ano do Ensino Médio foi complicado; depois da rejeição do primeiro rapaz, eu passei a acreditar que, se eu fosse tão magra quanto minha amiga bonita, talvez ele tivesse me escolhido. Depois de um ano lutando contra medidas drásticas, no meu aniversário de 16 eu decidi parar de comer. Essa decisão, que me assombraria pelos dez anos seguintes, não mudou minhas circunstâncias naquele momento: o segundo rapaz passou um ano me enrolando, enquanto ia e voltava com uma menina da nossa sala, e eu escutei “You Belong With Me” sem parar mais uma vez. Mas daí, quando veio nosso baile de formatura, meus colegas de turma me consideraram a menina mais bonita da festa — um tipo de elogio que alguém que foi rejeitada na frente de todo mundo por um ano não espera receber. Dali em diante, eu passei a acreditar que minha beleza, e meu valor, dependiam da minha magreza.

Eu comecei a faculdade na semana em que fiz 17, muito jovem, magra e orgulhosa. Minha arrogância quase me fez cair numa armadilha — um dos meus veteranos, que tinha 25 anos na época, se aproximou de mim. Ele era um leitor ávido de tudo que eu gostava, apreciador de música e cozinha italiana, tinha um estilo vintage, e fazia eu me sentir importante, vista, e muito madura. Olhando de fora, parecia um cenário ideal para um desastre, mas ele levou poucas semanas para passar de um sonho estético para o cara mais chato que eu já tinha lidado. Eu havia acabado de desperdiçar meus três anos de Ensino Médio sofrendo por caras que não valiam tudo aquilo, e não queria repetir o mesmo erro de novo (não tão cedo assim). Ele protestou, mas eu mesma decidi que era melhor que nós nos afastássemos. Cerca de um mês depois, enquanto ele ainda estava postando no Facebook sobre sentir muito a falta de “alguém”, a incrível “We Are Never Ever Getting Back Together” foi lançada. Escutei essa música sem parar por meses, dançando com a alegria de quem sabia que havia acabado de se livrar de uma bomba.
A sensatez que eu demonstrei com meu veterano não deu as caras de novo por alguns anos. Em algum ponto do fim de 2012, eu twittei “Taylor Swift tem o coração quebrado umas cinco vezes por mês”, um comentário corajoso partindo de alguém que se encaixava na mesma estatística. Na mesma época, poucas semanas depois desse tweet, no dia depois do Natal, eu me apaixonei pelo moço que me vendeu um livro sobre o Renascimento em uma livraria, e eu levei quase cinco anos para superá-lo completamente. Nós tínhamos a mesma banda favorita, ele amava minha série de livros preferida, e fazíamos aniversário com dois dias de diferença. Ele tinha uma obsessão juvenil mal resolvida com James Bond, assim como eu tinha com o Batman. Os meses que nós passamos juntos me deram algumas das memórias mais bonitas que eu tenho — essas coisinhas que valem a pena guardar conforme o tempo passa, e o passado fica mais nublado. Quando ele me largou pra ficar com outra pessoa, eu passei uma noite em claro chorando, sentindo uma tristeza que me acompanhou por muito tempo, mesmo quando eu fui escutar “Red” pela primeira vez, alguns meses depois. Eu me lembro que cliquei na música por causa do título, por causa da cor — eu queria saber qual era o som da minha cor favorita. Soava como eu me sentia — “but moving on from him is impossible // when I still see it all in my head // in burning red”. Era uma sexta-feira, e eu me lembro de escutar sem parar aquela música, e aquele álbum, naquele fim de semana, um dos muitos que eu passei terminando trabalhos na sala de projetos 24h da Arquitetura.

A repetição não foi suficiente para que eu aprendesse algumas coisas importantes; em Setembro de 2013, eu fiz um tweet sobre pessoas que faziam tocar “I knew you were trouble” em loop na minha cabeça, quase como um radar, quando estavam por perto. Se eu tivesse dado ouvidos, teria evitado mais quase um ano de desgaste emocional. Eu ainda estava triste, mas, do meu lugar de tristeza, fiquei fascinada por um amigo dos meus amigos. De longe, tudo sobre ele parecia arriscado demais, mas eu ignorei os sinais, porque estava atraída por correr aquele risco. Eu não me lembro exatamente de como acabamos nos aproximando, mas ele me fazia querer escrever sobre ele, e eu comecei a publicar poemas no meu blog. Ele às vezes lembrava muito um personagem de filme, e me dava espaço para agir como uma também; nós compartilhávamos músicas o dia todo, eu fazia poemas sobre nossas conversas, deixava recadinhos escondidos por onde ele passava para ir pra casa, e eu trouxe de uma viagem uma estátua de leãozinho de presente, por causa do cabelo cacheado que ele tinha. Ele me deu um beijo uma vez, e eu levei quase meio ano pra descobrir que ele tinha alguém o tempo todo — “he was long gone when he met me”. Ele curtiu o post do poema de despedida que eu escrevi, e eu fiquei feliz em saber que ele sabia exatamente o quanto eu desprezava a forma como ele havia brincado comigo.
Acho que minha carência me impediu de entender que eu não deveria fazer tanto por outra pessoa como fiz por ele, mas eu realmente queria muito receber amor de volta. A decepção que veio em seguida acabou sendo a mais difícil, porque daquela vez eu acabei alcançando meu objetivo, e nós ficamos juntos por algum tempo. Esse moço não estava particularmente interessado em mim desde o começo, mas ele também gostava da minha atenção. Nós tínhamos a mesma idade, mas ele era calouro dos meus calouros na faculdade, e nos aproximamos falando de fé e música. Eu também lhe escrevi alguns poemas, e comprei vários livros de presente, que ele nunca leu. A primeira vez em que nós terminamos foi alguns meses depois que “Shake it Off” foi lançada; eu chorei muito, e dancei ainda mais, para sacudi-lo para fora de mim — “Heartbreakers gonna break, break, break, break, break”… Mas não adiantou muita coisa, porque nós voltamos, e foi quase um ano indo e voltando até que ele decidiu que gostava um pouco de mim. Eu achava que ele era tão precioso, e que todo o trabalho duro que eu estava fazendo para que ele se apaixonasse por mim valia a pena. Nas muitas playlists que eu fiz, sempre colocava “Mine” da Taylor, ocasionalmente na voz da Naya Rivera — “you are the best thing that’s ever been mine”. Pela primeira vez, eu realmente achava que queria me casar com alguém, mas antes nós teríamos que sobreviver ao ano em que eu ia passar estudando na Inglaterra… Mas isso não aconteceu.

Estar longe dele me fez perceber o quanto eu havia me cansado de trabalhar pra ser amada, e esse sentimento foi me afastando dele, até que terminamos via FaceTime. Eu nem consegui ficar triste; eu me sentia livre. Tentar me tornar a garota que ele queria, que tinha a aparência, as roupas e o comportamento que ele achava desejáveis, havia me apagado inteira, mas agora eu estava no meu país dos sonhos, e tinha tempo pra me reencontrar. Meu intercâmbio foi um ano incrível. Eu era vizinha do estádio do Leicester City, e, naquele ano, nós tínhamos incontáveis placas escritas “Fearless” espalhadas pela cidade, porque aquela foi a temporada em que os “Fearless Foxes” venceram a liga. A associação me fez revisitar “Fearless” incontáveis vezes, e acabei relacionando a música ao líder de louvor bonitinho que me impedia de me concentrar em Jesus nos cultos da minha igreja no Reino Unido. Ele me dava carona toda semana depois dos nossos pequenos grupos, e nós nos divertíamos muito — “In this moment now, capture it, remember it”. Ele era legal e gentil, e às vezes parecia que ele estava tão distraído por mim quanto eu estava por ele, mas as circunstâncias mostraram que não íamos virar nada. Eu fiquei entristecida por um tempo, e ainda estava triste quando voltei pro Brasil, mas a dor passou rápido, e eu guardei mais coisas boas que ruins. Eu achava que me apaixonar na Inglaterra seria muito bonito, mas hoje eu vejo que ele estava certo em não deixar que fosse outra coisa. Por sorte, eu guardei um bom amigo.

De volta ao meu país, eu sentia que havia chegado a um certo limite de tentativas fracassadas, e estava pronta para uma longa temporada sozinha. Não parece que foi há tanto tempo assim, mas eu só tinha 21, o que é razoavelmente menos que 26. Nem preciso dizer que não cumpri minha promessa — eu já estava apaixonada (e triste) de novo quando fiz 22. Mas dessa vez, eu juro que realmente parecia que as coisas seriam diferentes; mesmo tendo terminado mal de novo (spoiler!), hoje eu vejo que a sensação que eu tive foi só uma consequência do ar de seriedade que tudo na vida começa a ganhar quanto mais adulto você se torna. Ele era de longe a pessoa mais interessante que eu já havia conhecido, e nós nos identificamos intelectualmente de uma forma que eu sempre havia desejado me identificar com alguém. Nos tornamos ótimos amigos, e eu recebi sinais confusos o suficiente para gravitar por quase dois anos ao redor dele. Na minha cabeça, ele era um Superman de verdade, como aquele sobre quem a Taylor canta — sempre voando, fazendo algo para salvar o mundo, enquanto eu estava em casa, terminando minha graduação e descobrindo o que faria depois — “I’ll be right here on the ground // when you come back down”. Isso foi em 2017, o ano em que as músicas dela voltaram para o Spotify, em Agosto; “Superman” apareceu na minha lista de mais tocadas do ano, assim como “Sparks Fly”, que conseguiu o 2º lugar. “Red” também estava lá.
Entender que eu precisava seguir em frente aqui foi muito difícil, porque eu alimentava uma esperança torta de que eu deveria ficar por perto, porque valia a pena esperar por ele — “I’m captivated by you baby // like a fireworks show”. Eu já havia sido rejeitada muitas vezes àquela altura, mas reconhecer que não seria diferente dessa vez demandou muito, porque eu acreditava que aquela era a melhor versão de mim, oferecendo tudo que eu tinha de melhor, para alguém que me parecia ser a melhor pessoa que eu poderia conhecer — e eu não fui suficiente. Mesmo tendo deixado ele pra trás há alguns anos, eu ainda estou me livrando dos resquícios dessa frustração específica. No meio do processo de entender que era hora de sair daquela situação, o moço da livraria, que nunca havia saído totalmente do fundinho da minha cabeça, entrou em contato comigo, querendo se desculpar por ter me largado sem muitas explicações há cinco anos. Lembrar desse momento ainda parece um delírio da minha lembrança, mas me ajudou a colocar todo apego que eu ainda tinha às nossas memórias bonitas no lugar certo, e me incentivou a dar passos para colocar um fim em coisas que não precisavam se arrastar. Enviei um email ao Superman algumas semanas depois, no dia exato em que completavam dois anos que havíamos nos conhecido, abrindo meu coração e me despedindo de vez. E então, meu coração ficou vazio de amores, e eu fiquei sozinha comigo mesma (e meu diploma).
Queria poder dizer que o ano seguinte foi como “I Forgot That You Existed”, mas não foi — foi bem ruim, de várias formas. Eu havia ganhado muito peso no ano anterior, por causa do estresse do meu TCC, e os pensamentos que me assombravam desde os 16 voltaram com força, e eu me sentia muito indigna de amor. Minha confiança estava em um ponto baixíssimo, mas, mesmo como recém-formada, triste e confusa, eu achei oportunidades de me divertir. Eu acompanhei o lançamento de “ME!” de perto, não só como fã de Panic! De muitos anos, mas porque queria ver se o clipe bateria o número de views nas primeiras 24 horas do clipe de “Boy with Luv” do BTS, que havia saído exatamente duas semanas antes. Foi nesse ponto baixo que eu comecei a estudar fandoms, e no fim daquele ano eu voltei pro Reino Unido pela primeira vez desde 2016 para apresentar minha pesquisa em uma conferência. Eu não reencontrei o líder de louvor que me distraía quatro anos antes, mas encontrei meu casal de melhores amigos, queridas amigas da internet, e alguns amigos da faculdade. Um deles era um jovem Arquiteto lindo e genial por quem eu tive uma queda platônica durante o intercâmbio. Dois dias antes de retornar para o seu país para as férias de verão, ele me disse que tinha um queda por mim também. Eu pensei nele várias vezes ao longo dos anos, imaginando se algo teria sido diferente se nós tivéssemos confessado um pouco antes. Encontrá-lo de novo foi doce. Nós tomamos um negocinho e conversamos sobre a vida juntos antes que eu voltasse para o Brasil de novo. Na época, a Taylor ainda não havia lançado “folklore”, mas quando lançou, eu ainda tinha a nossa conversa boba e despretensiosa passeando pela minha mente, a coisa na qual eu mais pensei quando ouvi “the 1” — “if one thing had been different // would everything be different today?”. Ele está em um relacionamento agora, e eu desejo pra ele tudo de melhor, porque ele é o melhor moço que eu conheço; poder ficar feliz por ele sempre faz eu me sentir melhor sobre o resto.
Desde então, ninguém mais esteve no meu coração. Queria ter contado uma história com um final mais feliz, mas o melhor que eu tenho é isso. Mas eu espero que você não tenha me entendido errado — eu não me vejo como uma vítima da vida. Eu tive algum azar, mas, no final das contas, sou apenas uma pessoa que demorou demais pra entender que realmente poderia fazer coisas melhores na vida além de namorar os moços por quem ela foi obcecada em diferentes temporadas. Acredite se quiser, isso não é nem metade das minhas histórias; além de todos os detalhes que eu preferi omitir, ainda tenho mais moços, que causaram mais drama, um ou dois que valeram a pena, e um ou dois com quem fui eu quem errei muito, mas cuja trilha sonora não eram músicas da Taylor — talvez eu tenha que escrever outro texto, contando tudo da perspectiva de “Electra Heart”. Eu entendo que o valor de acumular tantas histórias assim é questionável, mas eu estaria mentindo se dissesse que não gosto de recontar as coisas imbecis que eu fiz, como uma terceira pessoa que se entretém observando um personagem fazendo escolhas ruins, desejando poder intervir e contar o que acontece depois. Talvez seja a melhor forma que eu encontrei para lidar.
Mas eu acho que as coisas pelas quais eu passei fazem com que eu me sinta feliz pela Taylor, e não só porque ela teve êxito construindo um império de cada vez em que seu coração foi partido: testemunhar suas histórias com amigos e amantes contadas pela mídia, enquanto eu mesma navegava meus próprios desafios, faz com que eu sinta alguma coisa queimando quando ela canta “hell was the journey, but it brought me heaven”. Ela tinha 30 quando lançou isso; eu tinha 25 quando ouvi pela primeira vez, a idade na qual eu sempre desejei me casar. Como uma solteira de 26 anos, às vezes eu sinto o peso da passagem dos meus 20, e do desafio de repensar o que significava ser jovem e cheia de esperança aos 18, e o que isso significa agora. Não são muitos anos, mas são muitas mudanças, mas eu entendo que a melhor percepção das coisas só se torna discernível conforme o tempo passa. Toda vez que eu relembro das minhas histórias de amor, e me surpreendo de novo com minha estupidez, eu reconheço que a poucas pessoas é concedido o dom de tirar um final feliz do meio da própria tolice. Por outro lado, fico feliz que nenhum desses homens por quem eu sofri se tornou mais que um ponto em uma página na minha história, porque a chave de tudo é entender que eu estava correndo atrás de quem não pertencia a mim. Aliás, um deles acabou se casando com a garota por quem ele me trocou, e eles acabaram de se tornar pais. Talvez eu também devesse mandar um presente para o bebê dele.